terça-feira
Poesia, Então!
Mas que história é essa de poesia?
Dizia a mãe
E estendia a mão
E ele entendia
Que no mundo do quadrado
O triângulo é atrasado
E fazia de tudo
Tudo mesmo o que queria
Só que tinha problema
Sempre que falava em poesia
sexta-feira
Despedidas
É engraçado como a vida costuma lidar com o tempo. É como uma fuga constante de algo inevitável. É sempre uma tentativa desesperada de adiar despedidas, de neutralizar dores, de conservar sentimentos que de qualquer forma você vai perder mesmo. E passamos então a vida fugindo do tempo, nos escondendo em becos escuros, nos metendo em ruelas desconhecidas. Só pra evitar o tempo.
segunda-feira
Quanto tempo dura um amor pra vida toda?
Depende.
Depende de até quanto seus dedos podem contar; depende do quanto sua mão vai aguentar segurar a minha.
sexta-feira
Don't Panic
Acordou mais cedo e sentiu alguns respingos da chuva da noite passando pela janela e acertando sua face. Escorou-se nas mãos. Sentiu os pés tocarem o chão frio. Olhou para o espelho. ’Que reflexo horrível’, pensou. Levantou-se. Ainda estava de jeans e meia. Dormira do jeito que chegara. O corpo fragilizado pela falta de músculos aparecia no espelho. Estava com fome. Mas isso era normal. Toda manhã sentia-se faminto. Até que realidades do dia que viria faziam-no sentir-se sem fome e ainda mais frágil do que o normal. Vira alguém chorar no dia anterior. Não se interessara em saber qual era o problema. Se problemas alheios fossem tão importantes assim, haveria um jornal matinal particular de todas as pessoas do mundo.
sábado
Notação Pessoal
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Caminhar e fazer desenhos no céu, e girar o corpo entre os dedos, e correr sem medo entre segredos que ninguém jamais foi capaz de desvendar. E deixar que a história se conte, e esconder a vergonha de sorrir, e fazer de tudo um livro mais fácil e com letras menos rebuscadas. E não ter medo. E não ter medo. Não se importar por não entender de tudo, com a consciência de que nem tudo tem explicação, afinal. E acreditar que as coisas podem simplesmente acontecer, e que não precisam de um motivo concreto pra isso. E acreditar sem receio que filmes de romance realmente existem, e admitir que isso, no fundo, é o que todo mundo quer para si: uma historinha de final feliz. E não ter medo do escuro, porque afinal é no escuro que a mente se ilumina e que os pensamentos fluem da forma certa. Não ter medo de arriscar, de riscar o muro de coisas que você gostaria de ter feito, mas o medo não deixou e tempo se encarregou de apagar. E conseguir dizer não, e querer dizer sim. E ter plena consciência de que só porque você não grita, não quer dizer que as pessoas não notem seu desespero. E ter forças para admitir que as coisas não estão bem, quando elas não estiverem. Por favor, faça isso.
Falta muito pouco agora.
E Somos o Que Devemos Ser
"Mando-te beijos em outdoors pela avenida. Você, sempre tão distraída, passa e não vê... e não vê."
Seria tão difícil assim diferenciar o que aconteceu até agora e o que ainda há de acontecer, e adivinhar que tudo não é um sonho, afinal?
segunda-feira
Aonde Formos e o que Acontece De Fato
“Saudades é sentir falta?
Sentir falta é saudade?
Amar é gostar de verdade?
Gostar é amar de verdade?”
O costumeiro sorriso irônico de criança fazendo travessura se fazia na boca dela, enquanto corria e deixava os cabelos tremularem ao vento. Ele arfava a alguns metros de distância, o ar lhe escapando dos pulmões. Nunca ninguém poderia dizer que eles não seriam felizes. De fato eram. A crise que esmagava o país contra a parede fazia pouco caso dos dois. Ou eles faziam pouco caso dela. O apartamento encardido que cheirava a pizza ainda estava lá. Eles também. E as pizzas. O telefone público em frente ao prédio, pelo qual passavam trotes tinha sido arrancado por um acidente. Mas não importava mais. Isso, não mais. Estavam indo buscar o filhinho na escola pública próximo de casa. O índice de violência lá só não era maior do que no subúrbio abandonado da cidade, onde havia mais assaltantes do que pessoas de bem.
domingo
Andar na chuva , correr no meio fio e o ato de amar
Esteja preparado para correr quando começar a chover. É sempre assim. Ou talvez não. Mas você está ali, feito um bobão, esperando que algo incrível aconteça, com direito a fogos de artifício e feriado nacional, e o que acontece de mais divertido ou impressionante é um resfriado terrível. São simples e conhecidas conseqüências do ato de andar na chuva. Esteja preparado a se molhar.
O ato de perdoar
Por três vezes se aproximou, mirou o outro indivíduo bem no fundo dos olhos e disse, como se nada no mundo fosse mais elegante ou agradável de ouvir:
__Desculpe.
É claro. Afinal, as pedras todas já haviam sido jogadas contra a cruz, e o corpo do outro jazia ali, quebrado pela queda. Um risinho maldoso e nada sincero perpassou por sua boca. O que pensar de um delator, de um traidor? Qual pensamento seria correto sobre uma pessoa que infringe o bem maior de qualquer indivíduo: a dignidade. O pedido de desculpas nada mais é do que uma forma de sentir-se livre e limpo consigo. Desculpas são palavras sujas. Arrependimento. Mesmo sincero. O Cristo morreu, e Judas? O arrependido cortou de si qualquer chance de perdão ou de absolvição. Pendeu o pescoço entre o corpo pesado e a cabeça, e puxou a corda. Um minuto e uns tantos segundos a mais. É só. Culpa e arrependimento.
Desculpas sempre serão dadas, é uma maquinaria da sociedade. Não há mais a necessidade de arrependimento sincero para que se peça perdão, e não há mais a isenção da culpa para que se responda ‘ perdoo’. Religiões e inquisições estão espalhadas pelo mundo, denotando e conotando a necessidade de perdoar o próximo, quando a hipocrisia não os deixa perdoar qualquer ato de semelhantes. Então, use o perdão, mas não como obrigação. Como sentimento e pensamento sincero de quem quer perdoar.
As guerras não seriam guerras, e a palavra seria erradicada, se resolvêssemos por em pauta o que realmente importa: o bem estar do próximo. ”E quanto a mim?”. Bom, se todos mantivessem o compromisso de preocupação com o irmão, tenha a certeza absoluta de que em algum lugar, não importa onde, alguém estaria preocupado com você.
E passe bem. E perdoe. E seja perdoado. E não cobre do mundo muito mais do que isso, afinal, só terá direito de cobrar algo de alguém quem sempre fizer e olhar por um terceiro.
quinta-feira
Como fogo
O sangue quente jorrava para fora como se daquilo dependesse sua existência. Lá estava ela.
Apenas alguns metros separavam a quase impossível felicidade da real dor. O coração esmagado soprava tudo o que ainda restava de existência para fora. Era assim. Fora do coração. Pregado na alma. As nesgas de um longínquo sorriso sumiam. Os dentes desapareciam. Os olhos pararam congelados, indiferentes ao tempo. E diferente do que se poderia imaginar, diferente do que era certo, o mundo continuava a girar. As pessoas ainda sorriam. E imaginava parado ali, como podiam. A maior dor do mundo parecia não atingí-los de forma alguma.
domingo
Tristeza(nem tanta assim)
Hoje uma velha ‘amiga’ veio visitar-me. Tomamos bebidas fortes demais para a ocasião. Falamos sobre o que você imaginar. Imagine atrocidades. Assistimos TV. Lemos o noticiário esportivo no jornal da semana passada. Almoçamos juntos, tão juntos quanto pode ser concebido estar. Tomamos banho juntos. Jogamos baralho. Ela venceu. Na verdade, eu já queria que ela fosse embora de vez, mas a inconveniência tanto dela quanto minha não nos permitia um afastamento. Ela riu mim. Mais de uma vez. Ela faz isso toda vez que me visita.
Pus a cabeça por baixo do travesseiro enquanto tocava uma música qualquer, e corri os olhos por todo o espaço do quarto. E ela ali, me olhando sem curiosidade e sem pressa de ir embora. Ligou o chuveiro, mas não tomou banho. Deixou a água ali, escorrendo pelo ralo encardido. Sorriu para mim, me desafiando a falar algo. Não falei.
Ela sumiu por alguns instantes, e depois voltou com algumas fotografias antigas de uma família feliz e unida, em uma viagem longínqua e em um passado distante. Quanto pior eu ficava, mais ela sorria e mais e mais parecia tornar-se uma moradora oficial da casa. Moraríamos juntos, e eu não tinha nem coragem de lhe pedir que se retirasse. Ela é geralmente assim; extremamente inconveniente.
Mas raios revoltos de sol entraram pela janela e a avisaram que talvez fosse melhor ir embora. Ela me olhou com compaixão, sorriu sem graça e saiu pela porta da frente, como alguém de verdadeira honra deve fazer. Não que ela tenha alguma. Ou tem? Não sei. Mas posso afirmar que ela só é inconveniente quando já está conosco. Só nos visita quando pedimos. É uma verdadeira dama quanto a visitas. Só surge com um convite vindo de nossas próprias mãos.
Espero não vê-la tão cedo.
quinta-feira
Breve reflexão sobre o Tempo
Fez que ia chover. Não choveu. Mas ficou tudo nublado por um bom tempo. Mal tempo. E enganaram direitinho. Até caíram algumas gotas de chuvisco que vem antes da chuva. Mas não choveu. Ficamos todos ali, no meio da rua, de braços abertos. Esperando a chuva cair. E estava tudo nublado. Dava até pra chorar, tamanha era a depressão da situação. Não chovia. Quase nada. Chuvisco maldoso, que molha todo mundo, mas não alimenta as plantas. E nem cria poças. É fraco.
O sol ainda se recusava aparecer,que nem uma criança ,dia de segunda, antes de ir pra escola. Preguiça.
E o sol começou a dar risinhos descontrolados. Riu de todo mundo que tava ali, esperando a chuva ou até ele mesmo. Sei lá. Tem gente pra tudo. E ele riu sem pausas sinceras, até que ficou sério com a nossa cara de raiva pra ele. As nuvens também estavam feias. Não formavam nem coelhos, nem elefantes, nem mesmo dragões, que feitos de nuvem não metem medo em ninguém.
E passamos a tarde esperando a chuva, e nem choveu. Quase nada.
A felicidade só ameaçou chegar, mas nunca veio. Talvez só venha no finalzinho do ano, com os presentes. E o papai Noel. E a chuva.
circus
Poetas e loucos, bastardos inglórios da sociedade, amontoem-se aqui, por favor!Apresento-lhes agora um magnífico espetáculo, sem dúvida o maior do mundo!Sim, o maior do mundo!E corram, vagas limitadas, lugares marcados, vidas dependendo substancialmente disso para sobreviver!O circo dos palhaços chorosos apresenta orgulhosamente um cérebro humano!Sim!Com apenas alguns pouquinhos usados, nada que vá realmente fazer falta!
Este cérebro aqui,grande publico,é de um ser humano “normal”!Forço-lhes as aspas porque não há como saber quantos seres realmente conscientes existem neste mundo que o fogo há de cobrir. E pouquíssimo usado, o cérebro!Exato, minha senhora de vermelho aí atrás, e meu cavalheiro de chapéu adornado com peles de javali, um cérebro pouquíssimo usado!Novinho, para os padrões de venda, e vocês tendo a honra de ver esta iguaria antes que ela seja injetada numa sala escura de museu!Posso ate contar-lhes a magnífica história do corpo ao qual este cérebro foi alojado!
Esse cérebro pertencia a um corpo esbelto, de pelos ruivos, globo ocular com retícula em perfeito estado. Aos três anos o cérebro entrou numa escola. Este é o nome que os humanos dão ao local que supostamente os cérebros serão treinados.
Este cérebro aqui conseguiu o que os humanos chamam de estação de graduação. Este cérebro entrou a níveis de universidade, e este cérebro sentiu-se atraído por uma fêmea humana, e os dois uniram-se oficialmente pelas leis humanas, algo chamado de casamento. E estes cérebros por meio do ato sexual, após comprovado amor, geraram nova vida, com novo cérebro. É o que vocês ouviram: cérebros formando cérebros!E este cérebro pensou, e amou, e teve uma vida realmente agradável para os padrões humanos. Mas, eu disse, mas, para os padrões humanos. Bem sabemos que os padrões humanos é que destruíram os humanos!
Este cérebro cedeu aos falsos prazeres dos vícios, este cérebro presenciou outros corpos e outros cérebros morrendo de fome e sede. Não ajudou. Este cérebro esgotou os recursos naturais de seu planeta. E, aos sete anos, este cérebro viu o pai dar três tiros na mãe, e este cérebro passou o resto da vida justificando a dor pela dor. Este cérebro riu da dor. Este cérebro falava de política, criticava a corrupção. Este cérebro riu da dor alheia. Este cérebro riu. Riu de maldade. É. Este cérebro comeu bem no natal, data em que os humanos celebram o ‘sei lá o que’ de seu líder que um dia irá voltar. E este cérebro trocou presentes. É o que se faz no natal, não é?Tudo em nome do espírito natalino. Pessoas morreram de fome e de frio fora dos perímetros da casa deste cérebro aqui.
Grande público!Um cérebro de verdade que pertenceu a este mundo chamado terra!Espero que aprendamos com os erros deles e não levemos nosso mundo ao caos também.
Obrigado.
domingo
É de madrugada que os sonhos vêm
É de madrugada que os sonhos vêm
É de madrugada que os risos chegam
E os olhos ardem
Os cacos de lua caem na rua
E sujam tudo
E brilham tudo
E tudo brilha
É de madrugada que os sonhos vêm
É de madrugada que tudo faz sentido
É de madrugada que as mães beijam
É de madrugada que surgem as idéias
E que viram devaneios as mesmas
É de madrugada que os sonhos chegam
E mostram tudo com mais clareza
Como um vidro não mais embaçado
É de madrugada que os sonhos vêm
E afinal
É de madrugada que você vêm.
sexta-feira
Dia de homem
Caminharam pela cidade conversando sobre variados assuntos. O clima não fazia parte de nenhum dos dois, principalmente se você os conhecesse como eu. Ele falava qualquer coisa sobre a família e sobre como seria a incrível viagem para visitar alguns parentes.Haviam acabado de discutir.Ele falou mais do que devia quando ela disse que não queria ir a casa de seus pais.
__mas por quê?!
__porque eu não quero, ora.
Era um casal quase perfeito. Quase. Brigavam mais do que a história poderia aguentar.Agora brigavam e deixavam uma amargura pontilhada em cada frase depois de uma briga.E tornar-se-iam cada vez mais e mais rancorosos e grosseiros um com o outro.Já nem conversavam direito.O tempo compartilhado junto,que antes era cheio de sol e flores,como o verão e a primavera,tornava-se agora frio,como um inverno que custa a passar.Daqueles que duram meses a fio,e que você torce pra que pare.Mas não para.E o pior é que amavam-se mais do que qualquer um dos dois poderia aceitar.E a ligação tarde da noite,que antes era recheada com o diálogo dos risos e juras de amor sem fim,terminavam agora com um amargo "tchau" ou com o encerramento da linha no meio de uma frase.
Era próximo do dia dos namorados, e ele já havia dado a promessa de que não lhe daria nada. Quando chegou à casa que dividia com a mãe, ela conseguiu ainda derramar algumas lágrimas. Seu coração já não aguentava mais.Tinha que parar.E gritava do fundo do peito,com uma dor interminável;"faça parar!".Andavam pela rua enlameada(havia chovido a tarde inteira) e ela já havia desistido de tentar manter uma conversa plausível e sem discussões.
Ele parou de repente e perguntou o que havia. Ela disse que nada. Os dois tinham novidades. Sabiam disso.Ele queria falar da viagem.Havia terminado com o silêncio mórbido que ela fazia.Perguntou qual era a novidade que ela tinha.
Nunca vi um homem chorar tanto. Ela segurou-o em seu colo e teve a sensação de que tudo ali estava errado. Era ele quem estava chorando.Era ele quem estava dando sinais de fraqueza.Era ele.Ela disse que estava,depois de dois anos,desistindo dos dois.Deveriam terminar.Do pior jeito que se imagina.Brigando.
Naquela noite ele encostou a cabeça no travesseiro, ouviu algumas músicas tristes. Chorou mais um pouco. Não tinha vergonha de chorar.Era homem.E de tão homem que era não percebia que,com tanta ignorância e um esquecimento do amor que tinham,estava escrevendo junto com ela um final triste da história romântica que pertencia ao casal.Não terminaram.Resolveram mais uma vez tentar.Porque o problema não eram as brigas.Sempre brigavam.Nem os términos.Sempre terminavam.O problema era que agora ele sentia a gravidade da dor da perda.
terça-feira
Sorriso(L)
Diga-me que esta tudo bem, e acreditarei. Sempre fui bobo assim.
Diga-me que o mundo esta desabando e que vamos todos morrer. Acreditarei. Sou capaz de doar o sangue na vã confiança de que as coisas são como achamos que são. Daí crescemos e vemos que tudo que pensávamos quando crianças é pura mentira e invenção. Nuvens não são de algodão, o papai não é o homem mais forte do mundo e sua opinião sobre homens e mulheres não valia de nada, afinal. Era tudo mentira. Ou talvez, numa consciência um pouco mais ampla,quando éramos crianças víamos o mundo como ele realmente é,e tínhamos idéias interessantes de verdade sobre como tornar tudo um lugar melhor. E que façamos melhor, então.
Ou então que possamos simplesmente sorrir quando ninguém mais consegue, não na hipocrisia que corrompe a sociedade, mas na mostra dos dentes de quem tem coragem de lutar pelo mundo.
Parece ate algo estranho para se pensar, mas ainda existem pessoas que acreditam que ainda há uma solução, e que não devemos ficar sentados esperando a vida passar.
Como um meio comparativo: não fique sentado reclamando que não há vento; corra de braços abertos e faça o vento. Assim ,quem sabe,possamos algum dia dizer que achamos a solução de tudo, afinal. E talvez ela seja muito mais fácil do que possamos imaginar.
quinta-feira
Ele e Ela(2)
Fazia mais sol do que se poderia esperar de um dia como aqueles. Mas por quê raios ela estaria ali?Sozinha?Olhava para os tênis all star surrados e ria sozinha.Fazia caretas estranhas como quem ri de uma piada interna.Sorria para as pessoas que passavam.Falava com todas,e não recebia em resposta nada mais do que um olhar de censura assustada das mulheres e um sorriso sacana dos homens.
Apoiava-se com as duas mãos no banco encardido, e deixava o vento bater nos cabelos. Todos voavam, e ela sentia cócegas solidarias do ar. Um rapaz sentou ao seu lado. Começaram a conversar. Minutos depois ele tentou beijá-la. Ela desviou e riu. Ele foi embora encabulado. Ela mandou língua para suas costas. Alguns outros rapazes olhavam-na com esperança, e ela debochava daqueles rostinhos maliciosos do predador que se vê menos esperto do que a presa.
Ele vinha andando atrapalhado, contando algumas moedas. Ela viu. Riu. O ato foi tão simultâneo e rápido que não consigo descrever sem fazer com que pareça tolice. Talvez até tenha sido. Ela meteu o pé quando ele passava distraído por ela. Ele caiu. As moedas voaram e caíram descontroladas na grama. Ela sorriu. Ele não.
__compre-me um sorvete!__ela pediu atrevida.
__você me derrubou!
Ela olhou-o com inocência assustada. Seria atriz. Teria todos a seus pés. Já tinha. Ele literalmente estava. Metaforicamente também. Tentar manter a raiva naquela situação seria plausível, mas ele não conseguiu. Ele fazia um silencio surrado enquanto catava as moedas que ainda conseguia achar. Ela perguntou se ele tinha nome ou precisaria dar um grito toda vez que quisesse falar com ele. Ele olhou-a com censura total e disse o nome. ”mas que nome idiota!” foi o que ela respondeu, rindo. O vento açoitava-lhe os cabelos e ela lutava para mantê-los quietos.
Ele levantou e ia embora quando ela gritou pelo sorvete. Ele olhou-a. Riu com a cara de pau que aquela menina conseguia ter.
Ela corria na frente, assustando os pássaros e comentando sobre como seria legal poder voar. Ele concordava cansado. ”fale-me algo sobre você”, ele tentou puxar assunto com a garota que havia se recusado a dar-lhe ate o nome.
“algo sobre mim? eu gosto de você!”.
“Uau. esclarecedor.”
“mais do que você imaginaria.”
Passaram a tarde conversando. Ela tornou-o compositor quando o obrigou a fazer uma musica em sua homenagem. Riu de suas rimas, e disse que ate um bêbado escreveria melhor. Foram para um bar e ela deixou-o porre.
As rimas melhoraram. Ficaram mais pervertidas, e engraçadas.
Tocaram campainhas e correram. Ele, bêbado, caiu...
Acordou dez da manha totalmente ressacado. Nunca havia bebido. Não deveria ter feito aquilo. Estava em casa. Perguntou ao porteiro como havia ido parar ali. ”uma bela moça veio lhe deixar.” ele correu para a praça onde a havia encontrado no dia anterior. Todos os bancos estavam vazios, com exceção um ocupado por um casal de idosos que jogava milho para os pássaros. Ele perguntou por ela. Descreveu com exatidão, mas só foi entendido ao falar da “moça que grita com os pássaros”. Eles a viram-na. Contaram que ela estava com outro rapaz e uma criança, que havia gritado com alguns pássaros e que fora embora num carro importado.
Ele sentou no mesmo banco que havia encontrado a paixão mais rápida que havia conhecido. Olhou para os próprios pés e viu. Um pedacinho de papel todo enrolado na lateral descolada do sapato. Um bilhete.
“sei que não mereço alguém tão legal assim como você. Desculpe ter ido embora sem avisar. Era meu ultimo dia na cidade, então queria aproveitar o dia da forma que nunca o fiz, e você me proporcionou o melhor dia da minha vida. Não vou dar referencias minhas porque não quero você me procure. Quero evitar um sofrimento.A dor não é boa pra ninguém. Só quero que saiba que alguém tão legal como você não merece alguém como eu. Você deve estar muito bravo comigo. Eu mereço. Mas peço que não fique. Em um único dia você conseguiu se tornar a pessoa mais importante que já passou por mim. Prometa que nunca vai me esquecer, e eu prometo que um dia vou voltar.Prometo. Tenho que vê-lo ao menos uma vez mais para ter certeza de que o melhor dia que tive não foi fruto de minha mente doentia. Desculpe.
PS. você fica engraçado quando bebe. Devia fazer isso mais vezes.”
Ele passou o resto da manhã sentado ali. E assim fez por muito tempo. A chuva embaçava seus óculos, e ele continuava ali. Decidiu que esperaria por toda a vida se houvesse necessidade.
Afinal, a historia só terá final feliz se você quiser fazê-la feliz. Então ele esperaria. Se ela voltaria ou não... As nuvens talvez a trouxessem junto com a chuva. O melhor dia da sua vida pode ser o da perda. Mas se, antes da perda, coisas boas aconteceram, então não terá sido em vão.
sábado
Dia Dos Desacompanhados
Amor. Palavrinha tosca. Palavra de fim e de começo de relacionamentos. E é exatamente isso que não discutiremos aqui (se você espera um pouco de emoção, vá para os primeiros posts ou assista ao programa do Gugu, porque aqui você não há de encontrá-la). Os modelos repetitivos e jeitos transversais de fazer um relacionamento durar tempo o bastante para que se possa soletrar corretamente a palavra Schwarzenegger já está saturando a mente daqueles que procuram para a vida mais do que alguns momentos de insanidade. Já dizia o verdadeiro poeta, ’dane-se tudo isso’. Amar até que é fácil, se comparado a ser amado. Então hoje (dia dos namorados), nada mais justo do que discutir prazeres e desencontros dos desamores da vida de cada um, daqueles que (como eu) estão solteiros e dormirão abraçados de nada mais do que o travesseiro velho que lhe acompanha todas as noites, ou o ursinho de pelúcia com cheiro de mofo de tão velho que é.
O que seria do mundo sem aqueles que simplesmente não conseguem ter um relacionamento sério?O mundo dos namorados simplesmente é chato demais para ser considerado. E se Platão não tivesse sido um nerd solitário?Onde estaria o amor platônico?E se Renato russo tivesse achado a mulher (ou o homem) da vida logo na juventude?E o que seriam dos bêbados solitários?Definitivamente um mundo totalmente cheio de amores não seria o melhor para todos. Só os desamores me fazem crer que um dia as coisas vão melhorar (e só isso). Estou esperando esse tal de amor pra vida toda desde os meus quatro anos,quando descobri que ele poderia existir. E o principal: o que seriam dos felizes namoradinhos sem os amigos solteiros para segurar vela ou para dar conselhos totalmente sem nexo depois de uma briga?Sinta-se hoje uma das pessoas mais importantes que já passaram por esse mundo, por que sem você (eu quis dizer eu), as coisas não seriam tão legais como são hoje. Então, pegue seu pote de sorvete, um chinelo bem velho e assista (de novo)a ''um amor para recordar''. E creia que um dia você irá para o time dos comprometidos. Se isso te deixou deprimido, encha a cara de vodka e tudo se resolverá de manhã.Tchau(vou procurar meus chinelos).
segunda-feira
Casal
__amoor...
__...
__amor?
__...
__você está acordado?
__...!
__AMOR!
__que foi,merda?!
__ah,desculpe.Pensei que você tava dormindo.
__aff...
__você vai sair hoje?
__não.Tem jogo.
__que tem o jogo?
__tem que eu vou assistir.
__o jogo?
__não.A novela.É claro que é o jogo.
__mas quem vai jogar?
__o flamengo.
__contra o Brasil?
__não.O flamengo não pode jogar contra o Brasil.
__por quê?
__é complicado.Outro dia eu explico.
__tá me chamando de burra?
__nem que eu quisesse.
__hã?
__nada.
__...(silêncio ofendido)
__...(silêncio do tipo ‘não sei o que eu fiz’)
__você vai sair hoje?
__NÃO!
__mas você não podia sair nem para me fazer um favor?
__qual é a merda do favor que você quer?
__nada.Mas se eu quisesse um favor você sairia pra fazer?
__mas que droga você acha que está fazendo?
__você faria ou não?
__faria.
__você vai sair hoje?
__não.
__mas e o favor?
__você não o quer.
__e se eu quisesse?você me deixaria na mão?
__P-U-T-A-Q-U-E-P-A-R-I-U!
__não gosto quando você fala palavrão.Me faça um favor?
__qual é o maldito favor?
__vá à farmácia e me compre alguns anticoncepcionais.Diga ao farmacêutico que esses em especial aumentam o tamanho dos seios.Ele saberá.
__você quer que eu vá à farmácia...
__isso.
__e peça ao farmacêutico..
__ahãm.
__remédios para o crescimento dos seios.
__é.
__é foda.
__o quê?
__nada.
Ele se levanta e vai se arrumar para sair.ela:
__ei.
__?
__não quero ficar sozinha.
__...
E os homens são complicados...
domingo
Dor
Chorou como se o mundo fosse acabar naquele momento.
__você volta?
__volto.__ele respondeu. Não voltaria. E ela sentia vontade de chorar, e de correr gritando o quanto estava triste. Ela sofria, e o mundo não queria parar. Continuava doendo, como uma brecha que se abre no meio da sua caixa torácica, entre as veias visíveis e o cérebro. Chorou. Doía muito. Ele não voltaria. Ela sabia disso. E se irritava por saber. Gostaria de poder manter as esperança de ver aquele sorriso desconexo uma vez mais. Não veria. Queria poder fazer cócegas ate ele perder o ar. Não faria. Chorou. Tinha o direito de chorar. Não queria. Lembrou-se dele sorrindo no natal, quando ela tropeçara e derrubara a garrafa de vinho. Cheiro de álcool. Ele sorria. Não sorriria mais. E ela ali. Não saberia viver sem vê-lo. Sem tê-lo. Não resistiria. Morreria. Ou até pior: não morreria. Sofreria até a ultima grama do que é possível sofrer. Secaria todas as lágrimas do mundo. E tomaria todas para si. Ele tinha que voltar. Mas não ia. Por quê?Fácil. É sempre assim. Amamos. Não sabemos amar. Maltratamos. Isso nós sabemos bem. E quando o amor resolve ir embora, nos arrependemos, e queremos que o mundo acabe porque vamos chorar todas as lágrimas que existirem entre nós e o fim do universo. Não merecemos. Talvez até sim. Mas não desse jeito. Dor fria. Dor. Ele daria seus últimos suspiros dali a pouco numa sala imunda de hospital. Dor. Morreria olhando para o teto. Dor. Morreria com a metade do peso que deveria ter. Dor.
Ela foi para o banheiro e chorou. Até secar.
quinta-feira
Meninos E Meninas(capitulo 3)
“Os homens não servem. Não prestam. Pelo menos este aqui...”. Lissy pensava isso enquanto corriam pelos corredores do hotel. Daí você pergunta: ”Mas como uma garotinha de sete anos pode ter essa mentalidade?”. Daí eu, pacientemente, respondo: ”Sei lá, pows! Mulheres são assim! Elas já nos desclassificam na memória desde pequenas!” Não as culpo.
Edward encaminhava Lissy para uma fuga pelas ruazinhas próximas as torres de pizza.
Entraram num beco encardido. Tinham fugido enquanto o pai de Edward participava de uma conferencia. Atravessaram varias ruas correndo e foram xingados por diversos motoristas mal humorados que voltavam para casa depois de mais um dia estressante e que esperavam sinceramente ter um motivo para descontar a raiva na esposa e filhos. Agora o tinham. Uma garotinha loura que não tinha olhos azuis quase conseguira destruir sua amada lataria nova com o peso do próprio corpo.
__Edward!Onde estamos indo?__casa vez mais lissy se irritava com essa terrível mania de correr por ai. Estavam fugindo de que, afinal?
__Quero mostrar-lhe um lugar onde tenho muitos amigos. Quero que lhe conheçam!Eles me ensinaram muitas coisas!
Já haviam diminuído os passos quando entraram numa área cada vez mais remota e escura da cidade. As estrelas já apareciam quando pararam em frente a um bar de aspecto velho e doentio. Exatamente o tipo de lugar que você não quer que o seu filho freqüente antes dos trinta e cinco.
__Não vou entrar aí.
__Que bom. Não é ai que vamos. Quero que conheça uns amigos viciados na jogatina e no trafico de drogas. Mas eles são fracos demais para esse local.
Entraram num prédio espremido em alguns metros quadrados que separavam dois cassinos. O ar estava carregado com fumaças de todos os odores, e pessoas definitivamente fora de si andavam cambaleando pelo estreito corredor que servia como entrada única para o local.
__Quem são essas pessoas, Edward?Por que estão neste aspecto deplorável?
__Ah, são os viciados. Sem eles o mundo nem giraria.__Edward citava palavras usadas por um de seus ‘amigos’ para responder á primeira pergunta que ele próprio fizera ao entrar naquele local pela primeira vez.
Entraram numa sala mal iluminada.
__Uau!Nosso amiguinho tem namorada agora?Ou seria ela muito novinha para ele?__uma voz gutural falou isso, e quando os dois viraram-se para olhar, encontraram um homenzinho de aspecto frágil.
__Tom!__Edward gritou feliz.
Não posso continuar a história sem dedicar um capítulo inteiro só para explicar porque raios Tom aceita crianças no estabelecimento. Se você gostou da historia até agora,não se preocupe,são só processos para se entender melhor a lógica das coisas.Se você não gostou,dane-se.Espere algum tempo que o próximo capitulo(a historia de Tom,as ações de Tom,e quem raios é Tom)terá um pouco mais de ação.Falará de guerra.
quarta-feira
Vamos Fazer Um Filme!
Acho a letra incrivel.Teremos alguma conclusão tomada após o almoço -não tente ver sentido na frase.Apenas sorria e acene.Dedico a todos aqueles com quem convivo todos os dias,e torço sinceramente para que sejamos eternamente legais uns com os outros, pra variar.
Achei um 3x4 teu e não quis acreditar
Que tinha sido há tanto tempo atrás
Um bom exemplo de bondade e respeito
Do que o verdadeiro amor é capaz
(Achei fotos de todos vocês,e passei boas horas rindo do rostinho infantil que cada um tinha.A minha eu escondi..desculpem,vergonha.)
A minha escola não tem personagem
A minha escola tem gente de verdade
(Confio em todos com quem convivo todos os dias,e quero todos sejam melhores do que eu sonho em ser.)
Alguém falou do fim-do-mundo,
O fim-do-mundo já passou
Vamos começar de novo:
Um por todos, todos por um
(O fim do mundo vem,o mundo acaba e nasce de novo.Só nós continuamos aqui,brigando e jurando ódio eternamente,quando na verdade não conseguimos nem nos afastar!)
O sistema é mau, mas minha turma é legal
Viver é foda, morrer é difícil
Te ver é uma necessidade
Vamos fazer um filme
(Quem disse que podemos ser reprimidos?Quem disse que aceitamos ordens?Quem disse que não choramos?Quem disse que conseguimos ficar sós?E registramos tudo para que no futuro possamos provar que somos bem mais do que o resto jamais imaginou ser.)
O sistema é mau, mas minha turma é legal
Viver é foda, morrer é difícil
Te ver é uma necessidade
Vamos fazer um filme
E hoje em dia, como é que se diz: "Eu te amo."?
E hoje em dia, como é que se diz: "Eu te amo."?
(Eu te amo=Palavrões,brincadeira sem graça,gestos obscenos.É só o nosso jeito.)
Sem essa de que: "Estou sozinho."
Somos muito mais que isso
Somos pingüim, somos golfinho
Homem, sereia e beija-flor
Leão, leoa e leão-marinho
(Não há segredos(nem que você queira guardar algum!).Somos jovens,somos o que
quisermos ser,e somos sempre alguma coisa.Mesmo que achemos que não somos nada.)
Eu preciso e quero ter carinho, liberdade e respeito
Chega de opressão:
Quero viver a minha vida em paz
Quero um milhão de amigos
Quero irmãos e irmãs
(Nem eu sei direito quando quero ficar sozinho,ninguem sabe.Queremos paz,mas queremos tambem conselhos e amigos de verdade.Os temos.)
Deve de ser cisma minha
Mas a única maneira ainda
De imaginar a minha vida
É vê-la como um musical dos anos trinta
E no meio de uma depressão
Te ver e ter beleza e fantasia.
E hoje em dia, como é que se diz: "Eu te amo."?
E hoje em dia, como é que se diz: "Eu te amo."?
E hoje em dia, como é que se diz: "Eu te amo."?
E hoje em dia, vamos Fazer um filme
Eu te amo
Eu te amo
Eu te amo
(O mais belo pôr do sol vem e passa,mas só amigos de verdade são para sempre.No melhor convenio B que já existiu amigos pra vida toda nascem todos os dias.)
terça-feira
Meninos E Meninas(capitulo 2)
__Lissy, não demore!O pai de Edward já está aqui!
Obviamente Lissy havia recusado a proposta da viagem. As coisas não haviam saído exatamente como ela queria, ou esperava. Edward era um babaca. Ela não quis vê-lo pelo resto da semana. Tinha medo de que ele tivesse reparado na cara boba que ela fizera ao vê-lo se aproximar. Não queria vê-lo. Não ia aceitar a viagem. Respondeu negativamente a todos os bilhetes que ele mandara. Mas o garoto era imperativo. Mandou o pai pedir para os pais dela permissão para a viagem. ”Droga!”Ela lia um livro sobre as constelações numa tarde particularmente quente quando a campainha tocou. Era Edward. Ela sabia. Vira o carro chegar. Ele sorriu cinicamente quando a mãe dela pediu para o pai dele entrar. Naquele dia estava todo ‘engomadinho’.Queria causar boa impressão. ”Crápula!”. Ela aprendera a palavra horas antes com o próprio pai, um político convicto. O que quer que fosse crápula, Edward sem dúvida era um. Nojento. A mãe de Lissy não só havia aceitado a proposta de viagem como havia também sugerido que a garota passasse uma temporada inteira fora de casa.
__Lissy,você sabe que para mim é muito importante que você vá.Páre de negar algo que eu tenho certeza que você quer muito!__Foi o que Edward disse depois ,no quintal.Os dois conversavam na casa da árvore enquanto os pais discutiam datas."Eu quero muito é te matar por você ter me feito achar que ia ser beijada!".Lissy não falou isso.Mas pensou.
Nunca confie cem por cento nas garotas.Elas não dizem tudo o que pensam,e nem sempre vai existir um motivo real para elas se irritarem com você.Você é homem,isso basta.
segunda-feira
Meninos E Meninas(capitulo 1)
NOTA: Apresento agora uma crônica. Grande. Será divida em alguns capítulos. Este aqui é o primeiro. Espero que gostem. Comentem.
Lissy morava em casa de esquina, cidade do interior. Tinha sete anos. Morava com os pais, e era loura. Tudo culpa dos ancestrais saxões. Ela não gostava da cor dos olhos. Eram castanhos. Queria tê-los azuis, como os de sua avó. Mas não os tinha.
Lissy gostava do lago que ficava a apenas dez minutos de bicicleta de sua casa. Pena que ainda não sabia andar de bicicleta. As pernas eram curtas demais para alcançar o chão na bicicleta para doze anos, e toda vez ela caía. E caía sem parar até ficar toda arranhada e desistir. E resolvia ir a pé. Daí demorava muito mais. Meia hora, talvez.
A garota tinha um aquário, e os peixinhos dourados faziam bico toda vez que ela dava “soquinhos” no vidro. Lissy também tinha um irmão pequeno. Terrível. Terrível ter um irmão. Terrível ter Thomas como irmão. O moleque arrancava a cabeça das bonecas, jogava veneno para os peixes, e vivia furando o pneu da bicicleta de Lissy. Ela nem sabia andar, mas gostava muito da bicicleta. Ganhara do avô no ultimo aniversario comemorado antes dele sofrer um ataque cardíaco.
Aquela manhã em especial, Lissy poderia dizer que estava deprimida, se soubesse o significado da palavra. ”Droga de vida!”, pensou irritada enquanto lavava as janelas da cozinha. Trabalhar. Era criança, ora, pois. E pior, era um domingo!Era seu aniversário. E ninguém lembrava.
Mentira, Edward lembrava.
Edward. Ele sempre se lembrava das coisas. Ele sabia das coisas. Tinha viajado o mundo com o pai geógrafo, e conhecia mais do que a maioria dos adultos, que não tinham capacidade nem para lembrar um dia tão especial!
Edward morava a umas seis ruas da casa de Lissy, e sempre que podia fugia para visitá-la. Edward tinha cabelos castanhos, e os olhos eram azuis. Do jeito que Lissy gostaria de ter. Mas ela prometera a si mesma que se ela não tinha, seus filhos teriam a tão desejada cor dos olhos. Lissy casaria com Edward para assegurar que isso acontecesse. Edward não sabia disso. Mas eram amigos. Um dia ela contaria e ele concordaria, sem problema algum.
__Bom dia, Lissy!__Edward gritou de uma árvore próxima a janela que Lissy limpava no segundo andar.
__Oi, Edward.
Era engraçado como Lissy conseguia se reconfortar com essa maestria de Edward em sempre encontrar o lado positivo das coisas. Ele sabia que ela estava irritada pelo aniversário não comemorado, que estava cansada, e que muito provavelmente seria extremamente ignorante com ele. Ainda assim, ele ia visitá-la, e provavelmente ela receberia um convite para ir ao lago, onde ele mostraria como sempre algo que a faria sorrir e achá-lo um bobo sem nexo. Edward sempre fazia isso. Sempre conseguia surpreende-la quando nada mais era surpresa.
Edward correu ao redor do lago. Lissy, obviamente era muito mais lenta do que ele, e caía sempre que tentava manter um passo mais acelerado do que o normal.
__Edward, pare, por favor!Não agüento mais correr!
__Pararei assim que chegarmos longe o bastante para que os pássaros não nos ouçam!
__Mas os pássaros não são capazes de nos ouvir!
__Errado!Eles não são capazes de nos entender. Eu não quero que eles nos ouçam.
Ela continuou a correr, tentando acompanhar aquele arrogantezinho nojento.
Edward parou num ponto próximo á arvore preferida dos dois. Era nodosa e sempre dava bons frutos. E sombra.
Lissy olhou-o dos pés a cabeça e notou que, como sempre, ele estava com as roupas caras compradas em Paris totalmente imundas, da escavação em busca de coisas novas para estudar e examinar. Sempre ficava assim.
__Hoje é seu aniversario.
__Eu sei disso.
__Mas não vou lhe dar presente.
__Ótimo.
__Lhe farei propostas.
__Tente.
__Você deve aceitá-las, são ótimas.
__Veremos.
Ele estava radiante, ignorando todas as respostas agressivas que tinha recebido. Isso irritava Lissy, mas ao mesmo tempo lhe dava uma imensa vontade de rir. Como podia alguém ser tão irritante e cativante ao mesmo tempo?
“Amanhã meu pai fará uma importante viagem, ao redor do mundo. Me levará como seu ajudante, e quero que você vá comigo. Poderemos conhecer lugares incríveis, e então poderei lhe mostrar de fato todas as coisas que você merece ver. Faremos excursões em cidades antigas, visitaremos bares e roubaremos dinheiro dos bêbados, como deve ser feito. Que me diz?”
Lissy olhou-o no fundo dos olhos, procurando alguma nesga de mentira. Achou-a.
__Seu idiota!Não minta para mim!
__Não estou mentindo. Viajarei e quero que vá comigo. Quero lhe mostrar o mundo.
__E quem me provaria que esta não é mais uma piadinha irritante que você inventa só para acabar com meu dia?__Ele olhava-a quase em divertimento.
__Eu provo.__ele se aproximou dela, ficando a uma distância menor do que seria aconselhável (ou preferível) um garoto ficar de uma garota. Lissy fechou os olhos. Não podia acreditar que aquilo estava acontecendo. Podia sentir seu hálito. Hortelã. Uau!
__Tenho as passagens. Veja. Não estou mentindo.
Ela abriu os olhos. Ele estendia os bilhetes e os sacudia bem na sua cara, como se quisesse espantar um mosquito realmente incômodo. "Putz!".
Garotos são babacas. São uns verdadeiros imbecis sem tato. Só não são quadrúpedes. Não todos. Mas definitivamente todos são uns verdadeiros e completos babacas.
quinta-feira
Carol E As Estações(breve reflexão de outra historia)
Esta história originou o conto ‘enquanto os carros passam... ‘. É verídica.
Carol veio a meu encontro num dia qualquer das férias. Em julho.Era o verão mais quente dos últimos anos. Surpreendeu-me com sorrisos sem nexo e inocência sem fim. Fomos bem. Ela não era esperada, na verdade foi recebida sem muito apoio pelo próprio pai. Sorriamos e fazíamos de conta que os problemas nem existiam quando estávamos juntos. Os meus, sumiam. A Carol falava meu nome. Seus pais brigavam. Brigavam por tudo, na verdade. Ela nem entendia porque tanta discussão. Nem eram problemas tão sérios. Nem tanto.
Rápido, Carol completou seis meses, e seus pais brigavam com mais fervor do que antes. Muito mais. Ela chorava. Parece que não gostava de briga. Chorava até passar mal e vomitar. E apanhava por isso. Por isso. Só.
Ela aprendeu a dormir em meus braços, e eu aprendi a ter mais tato, a ser mais confortável a ela. A primavera chegou e as flores desabrocharam para o mundo. Carol sorria para mim. E corria.E caía. E chorava quando eu sumia. Ensinei-a voar. Ela ria, e perdia o ar de tanto rir.
Desculpe a falta de exatidão nos fatos. Minha memória preferiu guardá-las num lugar que eu ainda não consegui achar.
O outono chegou, e as folhas caíam. A Carol não. Já sabia andar se segurando nos móveis. Não precisava mais tanto de mim. Não posso dizer o mesmo. Amava-a.
Desculpe a falta de tato por não ter dito logo que a amava. Eu ainda não sabia o que era isso.
O inverno. Chuva. Doença. Carol já não sorria para mim. Eu me irritava. Não compreendia. Não sabia o que ela tinha, ou o que queria dizer. Ela não falava.
Na sexta de tarde ela passou mal, e foi para o hospital. Um tempo depois, na mesma tarde fria, o telefone tocou. Pneumonia.
À noite,quando as estrelas já tinham desistido de aparecer no céu nublado,e telefone tocou de novo. Carol tinha os dois pulmões comprometidos. Os dois.
Chorei. Nunca fui de orar. Orei. A noite gritava quente. Tremi.
As três da manhã o telefone anunciava o juízo final de uma historia que não tinha passado nem pela primeira vírgula. Em uma semana, Carol completaria o primeiro aniversário. Completaria. Choveu muito. Muito.
A história não deve ter um final triste. Eu sei que não consegui evitar isso, mas só contei a verdade como a vi. Choveu muito naquele dia. Eu já disse isso. Não sinto sua falta, porque sei que ela anda comigo, com os mesmos passinhos tortos de criança. Não sei se a historia é boa ou não. Mas gostaria que soubessem como surgiu “enquanto os carros passam...”, e a quem eu dedico todas as minhas vitórias.
segunda-feira
Aonde Formos(L)
Moravam juntos num prédio de paredes cheias de lodo no centro da cidade. Ela era enfermeira estagiária, e ele...bom, ele era cartunista, e universitário, mas só quando queria. E viviam como um casal. Quase não brigavam. O apartamento tinha um estranho cheiro de pizza, talvez porque era o alimento principal ingerido no local. Não tinham muitos bens materiais, mas eram felizes. A maior diversão que tinham era aos sábados, quando passavam a manhã assistindo a desenhos reprisados e programas de culinária. Ela nem sabia cozinhar, mas prestava atenção a todos os detalhes, até que ele a abraçava e lhe fazia cócegas. Passavam horas brincando disso, até que ela ficava sem ar de tanto rir e fingia estar irritada, só para receber alguns minutos a mais de carinho. Quando não tinham o que fazer, geralmente aos domingos de manhã, desciam as escadas do prédio e iam para o telefone público do outro lado da rua, passar trotes.
Iam para uma praia poluída perto dali e ficavam contando os pássaros, e eram muitos. Eles não tinham bens materiais de real valor, mas eram definitivamente felizes.
Iam para uma praia poluída perto dali e ficavam contando os pássaros, e eram muitos. Eles não tinham bens materiais de real valor, mas eram definitivamente felizes.
Ela ficou grávida. 'Não temos dinheiro, não temos como sustentar alguém novo', ele disse. E quando começasse a estudar?E a alimentação?Ele não tinha como sustentar uma criança, e não queria que ela passasse fome ou tivesse qualquer tipo de necessidade.Não podiam ter aquele filho e pronto!
No primeiro mês de gravidez,ela vomitava muito,e sempre que podia gritava que ele era um inútil e que todos morreriam de fome.Ele sorria nervoso e tentava manter a postura de homem da casa.
No sexto mês aconteceu algo atípico,e eles tiveram a primeira crise séria no relacionamento.Ela estava desproporcionalmente gorda,e ele absurdamente magro.Estava fazendo dois turnos de trabalho puxado todos os dias,e faculdade à noite.Chegava em casa cansado,mas ainda tinha força o bastante para ouví-la em suas intermináveis mudanças de humor. Ele sorria quando ela dizia que sentia a barriga mexer.Ainda conseguia,mesmo com o cansaço, fazer forças extras e projetava nela sensações diversas,numa massagem para agradar ao bebê.
Ele chegou em casa certa noite,mais exausto do que o normal,e a encontrou com as malas arrumadas,o único vestido que ainda lhe cabia cobrindo-lhe a enorme barriga.’Não aguento mais!’ela disse e tentou correr.A criança não lhe dava grandes vantagens.Ele não sabia o que fazer.Não sabia o que pensar.’Siga-a,idiota!’foi o que seu inconsciente lhe disse.Nesse meio tempo ela já havia entrado num táxi.Ele correu o máximo que pôde.Não tinha dinheiro algum para pagar outro táxi.Começou a chover,e as estrelas pararam de piscar no céu.
Já era mais de meia noite quando ela desceu do táxi na rodoviária.Disse ao taxista que ia buscar uma tia que estava chegando,e que então lhe pagaria a viagem.Correu o máximo que ainda conseguia e trancou-se no banheiro sujo e fedido que era usado por quem esperava os ônibus.
As contrações aumentavam como nunca. Ela deitou-se no chão frio do banheiro da rodoviária e sentiu a vida lhe escapar. Podia sentí-lo, mas não podia vê-lo, e isso lhe fazia sentir-se mal. Tinha sido burra. Não devia ter fugido da única pessoa que não lhe achava uma drogada inconsequente. Fugira da única pessoa que reparava como seus cabelos brilhavam ao sol das nove da manhã, e da única pessoa que achava seus olhos castanhos um mistério, não um símbolo de depressão. Ele reescreveu a triste história que a perseguia. Ele amava-a. E ela fugiu. Burrice.
Ele corria na chuva, sentia os pingos de chuva salpicando-lhe a face. Não sabia aonde ir, mas não podia perdê-la para a morte. Não resistiria. Avistou longe um táxi parado em frente à rodoviária. Sorriu. Ela estava ali. Ou próximo. Seu coração batia com tanta violência que parecia querer saltar-lhe pela boca. Passou pelo taxista, que parecia extremamente irritado. Ouviu baixinho uma musica, e sentiu toda a sua vida passando diante dos próprios olhos. “... Quando não estás aqui, sinto falta de mim mesmo, e sinto falta do meu corpo junto ao teu...”Incrível como ela conseguia tratar-lhe daquele jeito e ainda fazer com que sua paixão aumentasse mais e mais.Ouvia um choro baixo no banheiro.Era ela.bateu na porta com toda a força que ainda lhe restava no corpo,mas não conseguiu abrir.E assim bateu na porta várias e várias vezes,enquanto ela gritava com a dor que lhe escapava dos pulmões.
Uma criança chorou. O zelador da rodoviária relatou aos guardas que encontrou o homem desacordado ao lado da porta, com fraturas múltiplas nos braços. Disse também que arrombou a porta ao ouvir choro de criança, e encontrou-a largada ao lado da mãe, que já nem respirava direito.Passaram o resto do mês no hospital,e não puderam ver o quão famosos ficaram.Todos os jornais da cidade noticiavam a comovente historia da criança que nascera no banheiro da rodoviária.
E não ouviram quando um amigo próximo relatou ao repórter do principal jornal da TV."Eles realmente não tinham nada de valor.Não sabiam o que era ser realmente feliz.Agora tem um lindo filho.Encontraram de fato a felicidade!"
No primeiro mês de gravidez,ela vomitava muito,e sempre que podia gritava que ele era um inútil e que todos morreriam de fome.Ele sorria nervoso e tentava manter a postura de homem da casa.
No sexto mês aconteceu algo atípico,e eles tiveram a primeira crise séria no relacionamento.Ela estava desproporcionalmente gorda,e ele absurdamente magro.Estava fazendo dois turnos de trabalho puxado todos os dias,e faculdade à noite.Chegava em casa cansado,mas ainda tinha força o bastante para ouví-la em suas intermináveis mudanças de humor. Ele sorria quando ela dizia que sentia a barriga mexer.Ainda conseguia,mesmo com o cansaço, fazer forças extras e projetava nela sensações diversas,numa massagem para agradar ao bebê.
Ele chegou em casa certa noite,mais exausto do que o normal,e a encontrou com as malas arrumadas,o único vestido que ainda lhe cabia cobrindo-lhe a enorme barriga.’Não aguento mais!’ela disse e tentou correr.A criança não lhe dava grandes vantagens.Ele não sabia o que fazer.Não sabia o que pensar.’Siga-a,idiota!’foi o que seu inconsciente lhe disse.Nesse meio tempo ela já havia entrado num táxi.Ele correu o máximo que pôde.Não tinha dinheiro algum para pagar outro táxi.Começou a chover,e as estrelas pararam de piscar no céu.
Já era mais de meia noite quando ela desceu do táxi na rodoviária.Disse ao taxista que ia buscar uma tia que estava chegando,e que então lhe pagaria a viagem.Correu o máximo que ainda conseguia e trancou-se no banheiro sujo e fedido que era usado por quem esperava os ônibus.
As contrações aumentavam como nunca. Ela deitou-se no chão frio do banheiro da rodoviária e sentiu a vida lhe escapar. Podia sentí-lo, mas não podia vê-lo, e isso lhe fazia sentir-se mal. Tinha sido burra. Não devia ter fugido da única pessoa que não lhe achava uma drogada inconsequente. Fugira da única pessoa que reparava como seus cabelos brilhavam ao sol das nove da manhã, e da única pessoa que achava seus olhos castanhos um mistério, não um símbolo de depressão. Ele reescreveu a triste história que a perseguia. Ele amava-a. E ela fugiu. Burrice.
Ele corria na chuva, sentia os pingos de chuva salpicando-lhe a face. Não sabia aonde ir, mas não podia perdê-la para a morte. Não resistiria. Avistou longe um táxi parado em frente à rodoviária. Sorriu. Ela estava ali. Ou próximo. Seu coração batia com tanta violência que parecia querer saltar-lhe pela boca. Passou pelo taxista, que parecia extremamente irritado. Ouviu baixinho uma musica, e sentiu toda a sua vida passando diante dos próprios olhos. “... Quando não estás aqui, sinto falta de mim mesmo, e sinto falta do meu corpo junto ao teu...”Incrível como ela conseguia tratar-lhe daquele jeito e ainda fazer com que sua paixão aumentasse mais e mais.Ouvia um choro baixo no banheiro.Era ela.bateu na porta com toda a força que ainda lhe restava no corpo,mas não conseguiu abrir.E assim bateu na porta várias e várias vezes,enquanto ela gritava com a dor que lhe escapava dos pulmões.
Uma criança chorou. O zelador da rodoviária relatou aos guardas que encontrou o homem desacordado ao lado da porta, com fraturas múltiplas nos braços. Disse também que arrombou a porta ao ouvir choro de criança, e encontrou-a largada ao lado da mãe, que já nem respirava direito.Passaram o resto do mês no hospital,e não puderam ver o quão famosos ficaram.Todos os jornais da cidade noticiavam a comovente historia da criança que nascera no banheiro da rodoviária.
E não ouviram quando um amigo próximo relatou ao repórter do principal jornal da TV."Eles realmente não tinham nada de valor.Não sabiam o que era ser realmente feliz.Agora tem um lindo filho.Encontraram de fato a felicidade!"
sábado
Espero vê-lo Logo
“Espero vê-lo logo!”.
É um bom jeito de terminar uma carta para papai. Todos dizem que ele já vai voltar para casa. Eu não sei. Desde que ele foi embora, no final do ano passado, todos me prometem isso, no entanto, é cada vez mais raro que mamãe deixe que eu vá visitá-lo. Nem sei por quê. É só uma gripe. Gripe. Nem é uma doença tão perigosa assim. Eu sei que não posso correr, porque sinto falta de ar, mas isso não é gripe, é asma. E gripe é mais fraca que a doença que eu tenho. Papai não consegue respirar direito. Ele riu de mim quando levei meu aparelho que ajuda quando sinto falta de ar. Ele disse que não ia resolver o problema dele, mas eu acho que resolve, sim. Ajuda quando eu me sinto mal.
Semana passada eu fugi da escola e fui vê-lo. Ele estava mais pálido e mais magro do que da ultima vez que o tinha visto. Ele riu quando soube o que eu tinha feito, mas disse que um garoto de sete anos não deveria matar aula. Eu disse que fiz isso porque sentia saudades. Pude ver lágrimas escorrendo por seu rosto e desaparecendo atrás da barba, que está mais comprida do que de costume. Não sei o que foi que eu disse. Não acho que uma fuga da escola seja motivos para choro. Acho que ele estava brincando, ou fingindo, para que eu me arrependesse. Não sei. Papai não brinca mais comigo desde que foi para aquele maldito hospital, tratar da tosse. Mamãe disse que é gripe, mas não quer que ele venha para casa, nem fique perto de ninguém da família. Lembro que antes de ir para o hospital, ele tossiu muito, e saiu sangue. Mamãe chorou, mas eu ainda não entendo porquê. Eu caí de bicicleta semana passada,e nem chorei. Não choro mais, já sou velho demais para isso. Hoje todos os parentes de papai vieram nos visitar. Estão aqui em casa. Só que ninguém quis brincar de nada. Estavam muito sérios. Até o tio Louis estava sério. Acho que é o cansaço da viagem. Eu vi mamãe chorando no banheiro, e a vovó passou mal. Não sei o que aconteceu.
Sinto falta do papai.
Espero vê-lo logo.
sexta-feira
Enquanto Os Carros Passam
Eles moravam no interior, desses bem de fim de mundo mesmo. Desses em beira de estrada, que dava de ver os carros passarem a qualquer hora do dia. Ele era um rapaz quieto, calado. Até demais. Ela era moça de pele branquinha, quase transparente. O sol não lhe atacava. Todos os dias sentavam-se na cerca em frente da casa velha de barro onde moravam e ficavam lá, admirando os carros passarem. E às vezes chovia. Eles não saíam. Ficavam às vezes ate os pais dizerem que lhes dariam uma surra se não entrassem naquele exato momento. Eram irmãos. ”o céu é bonito!”, ele exclamava para ela. ”só por causa das estrelas!” ela respondia toda sorridente, sabendo que ele concordava. E admiravam o céu, e as estrelas, que maquiavam o céu todo.
Todos os dias era assim. Passavam horas e horas admirando os carros, e o céu, quando anoitecia.
Até que ela adoeceu. Doença estranha. Doença má. Doença que uma moça bela assim não merecia pegar. Levaram-na ao medico, na cidade grande. Ele acompanhava-a com todo o cuidado do mundo.
Até que não teve jeito. O mundo acabou. Choveu muito naquele dia. Dizem que ele gritou com Deus, e disse que ele não existia, e se existisse não era bom, porque tinha levado seu coração, lhe arrancado a vida sem dotes cirúrgicos, sem anestesia. Gritou que Deus lhe tinha tirado o sentido de viver. Sofreu demais.
O tempo passou. Ele casou, teve filhos, muito bonitos por sinal. Pele branca que nem a dela. Eram dois meninos e uma menina. A menina recebeu o nome dela, uma bela homenagem, diziam os parentes mais próximos.
Mas dizem que, todas as vezes que ele vai visitar a velha casa dos pais, senta na cerca caindo aos pedaços, e fica admirando os carros passarem, e quando anoitece, ele admira as estrelas. E dizem que ele comenta para o nada, ”o céu é bonito!”. E ele responde, sorrindo depois, ”mas só por causa das estrelas...”
quinta-feira
Crônica Machista
Certa semana, há um tempo, cheguei mais tarde em casa, e então a ‘dona certinha’ veio me atender logo na entrada. Estava com a cara toda aflita, como se tivesse visto o cachorro do vizinho ser atropelado.
__Olha, aconteceu uma coisa...
Eu, p* da vida:
__Problema seu.
__É a Carminha, a empregada... Está grávida!
__Problema dela!
__Mas ela diz que o filho é seu!
__Ah, isso é problema MEU, pô!
Ela fez cara feia e foi dormir. Acho que tem que ser assim. O homem da casa tem que se impor, afinal, quem manda somos nós!De manhã ela chegou comigo toda irritada, com uma camisa social branca que eu tinha usado na noite anterior.
__Você reconhece essa camisa?
__Claro, é minha!
__E você pode me responder uma coisa?O que significa essa marca de batom AQUI?!
__Significa simplesmente, querida, que você não lava minhas roupas direito.
Passamos o resto do dia sem trocar um palavrão. Mas tem que ser assim!Pra mostrar quem manda!
Uns dias depois era o aniversário dela, daí ela me disse que queria conhecer um lugar que nunca tinha visitado. Levei-a na cozinha. Brigamos como vira-latas, mas, afinal, ela deve ter entendido quem estava certo e resolveu esquecer o assunto.
Mês passado, estávamos no banheiro tomando banho. Ela ficava se olhando no espelho, e de repente soltou essa:
__Acho que vou por silicones!Meus seios são tão pequenos!
__Que nada, esfrega todo dia papel higiênico entre eles, e já, já você vai ter seios enormes.
__Papel higiênico?
__É.
__E funciona?
__Olha o tamanho que ficou a sua bunda!
O médico disse que com muita fisioterapia e um pouco de sorte, talvez eu volte a andar até o ano que vem. Mas afinal mostrei pra ela quem é que manda... Ela.
Ele e Ela(L)
Ela fazia de tudo, e corria sempre que sentia que algo de diferente estava rolando entre ela e outro alguém. Não que não gostasse de namorar, não, ela até tinha os seus casos. Mas quando sentia que estava ultrapassando os limites do “ficar”, ela logo se apressava em se afastar. Inventava uma briga qualquer, um defeito qualquer, e dava um jeito de negar-se a aceitar o amor. Deixou vários rapazes tristes, desolados, parece que um pegou até depressão, e ela ainda dizia que não estava nem aí. Ela simplesmente se recusava a aceitar um sentimento que lhe levaria a loucura assim.
Sim, porque amar é só para os loucos, não aqueles de frequentar hospício.Talvez até seja. Porque quem ama esquece o passado, vive o presente e sonha a vida no futuro, e sonha em mudar, em crescer, em ter filhos, mas sempre unindo tudo isso pelo sentimento dos ricos de loucura, os que amam. E ela não queria isso. Estava muito bem, obrigada. Não precisava de algo assim. E simplesmente tinha pavor do amor.
Até que o conheceu num dia de sol, quando ia sonolenta no ônibus para o colégio. Ele carregava uma pilha de livros, panfletos, ou seja lá o que for,ela nem reparou.Olhou abobada enquanto ele lutava contra o vento,que lhe açoitava todos os papéis.Ele nem era assim tão bonito,nem era assim tão alto,nem tão forte.Mas ela não conseguia parar de olhar.Ele desceu,e ela,nem sabia porque,desceu também.Sentia vontade de segui-lo eternamente,até o fim do mundo ,até onde nada poderia vê-los.
Parou numa sorveteria, e ela também. Ela então notou que ele encarava-a. Não que não estivesse olhando fixamente para o lugar onde ele estava, mas olhava tão concentrada, tão absorta, que nem reparou que ele também virou para admirá-la.
Ele então perguntou seu nome. Ela gaguejou mais do que pretendia. Sentiu raiva de si mesma por isso. Eles conversaram a manhã inteira. Conversaram sobre a cidade, sobre bandas de rock, sobre o aquecimento global, sobre a crise econômica mundial, sobre os times de futebol do estado, sobre a liga de basquete, conversaram sobre flores, e sobre como elas parecem uma criança de pele macia e toda molhada logo cedo, quando o orvalho cai. Conversaram sobre tudo. Conversaram sobre discos voadores. E conversaram sobre sonhos, e sobre como seus filhos se chamariam, e sobre como seriam inteligentes e teriam bom gosto musical, e conversaram sobre como os sonhos de hoje são corrompidos e sobre como tudo antigamente era mais fácil.Ela sentiu-se extremamente quente e viu que não sairia ilesa do que poderia ser a historia de sua vida.
Ela então o amou como nunca tinha se dado ao trabalho de amar alguém. Não que ele fosse muito bonito, ou forte, ou até mesmo alto. Mas era inteligente. E era leal, e sincero.
E era seu.
As cartas que eu não mando
"Hoje eu consegui ouvir estranhesas sobre o que pensam os néscios do mundo.Acordar definitivamente não é meu forte,ainda mais sabendo que não há nada forte assim que me fará dormir de novo.Percebi mais uma vez,e mais do que nunca,que ainda não sou tão forte assim para lembrar o quanto ela me faz mal.Porém,não sou fraco a ponto de deixar que ela me domine todo,e me amarre,e me jogue em algum lugar onde não possam me encontrar.Talvez até seja.E ainda assim me dizem que isso passa,que vai sarar,que um dia eu poderei respirar sem ter o seu perfume sendo injetado nas minhas narinas e depois em todo meu corpo,afetando até aonde a mente consegue voar,e eu acredito.Quero acreditar.Ainda não houveram guerras fáceis ,sem mortes,nem perdas,nem aquela vontade terrível de xingar o próprio coração,que insiste nesse frenesi de sentir apertos estranhos e doídos.
Talvez eu esteja exagerando,talvez não seja nada tão terrível assim,talvez ate amanhã mesmo eu esqueça que um dia ela me fez ter sono sem sonho,por a mente estar toda ocupada com o pensamento dela corrompendo minha tarde,até de noite.Eu gostaria que fosse diferente,preferia que ela nem tivesse surgido.Seria bem mais fácil esquecer os erros e deixar tudo para trás, mas agora não consigo esquecer nem que amanhã nos veremos de novo, e ficarei feliz de novo, e quando ela for embora, ficarei triste de novo.Parece até meio depressivo,e isso não é normal para mim,não sou assim,não fico assim fácil.
Não tenho vergonha de chorar,mesmo nem choraria por algo assim,alguém assim,mas tenho agora raiva e saudade do que eu poderia ser algum dia,se ela não tivesse aparecido."
quarta-feira
Primeiro contato
Este blog é a forma mais rápida e fácil de enxergar do lado de fora do mundinho sobre o qual andamos,despercebidos de tudo que acontece fora da geladeira.Falará(eu espero) do mais estranho ao mais improvável,tendo como objetivo principal nada além de passar o tempo que você poderia gastar lendo um livro ou fazendo algo mais útil.Mas você não fará nada desse tipo.Portanto,divirta-se,beba chá gelado e ponha o lixo pra fora!
Uma nota descontraída do autor.
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